
Em 1914, Freud introduziu em seu arcabouço teórico, através dos escritos Recordar, repetir e elaborar e Introdução ao narcisismo, a idéia dual da transferência.
No primeiro trabalho ele define o termo como conceito técnico, por assinalar uma modalidade especial do desenvolvimento do trabalho psicanalítico e, segundo esta modalidade, a enfermidade originária se transforma em uma nova que se canaliza para o terapeuta e para a terapia.
No segundo escrito, Freud coloca a transferência como um conceito psicopatológico.
Apesar de Freud colocar a transferência nestes termos, a verdade é que a mesma adquiriu, junto aos termos “resistência” e “interpretação” , o valor de tríade dentro do corpo doutrinário da psicanálise. Doravante, os termos se constituíram o tripé fundamental da prática analítica, atestando a genuinidade psicanalítica (ZIMERMAN, 2007, pág. 127).
De forma generalizada, pode-se conceituar a transferência como:
(...) o conjunto de todas as formas pela quais o paciente vivencia com a pessoa do psicanalista, na experiência emocional da relação analítica, todas as “representações” que ele tem do seu próprio self, as “relações objetais” que habitam em seu psiquismo, bem como os conteúdos psíquicos que estão organizados como “fantasias inconscientes”, com as respectivas distorções perceptivas, de modo a permitir “interpretações” do psicanalista que possibilitem a integração do presente com o passado, o imaginário com o real, o inconsciente com o consciente. (ZIMERMAN, 2007, pág. 127)
Diante desta definição, pode-se afirmar que sem o fenômeno transferencial, a genuína psicanálise jamais será praticada, posto que, a mesma se vale das interpretações dos fenômenos envolvidos, para fazer a interligação do passado e presente do paciente que, por vezes, se encontra “oprimido” por estar repetindo a mesma história/padrão de comportamento sem o perceber e, quando percebido, torna-se fonte de angústia, pois a posição de “não-saber” o porquê da repetição gera uma ansiedade no sistema psíquico que é expressa através da sensação de angústia e pânico.
É senso comum entre os psicoterapeutas e psicanalistas que o conceito de transferência é de vital importância para o avanço do processo terapêutico. O uso ou interpretação correta da transferência é apontada como determinante no sucesso ou fracasso do tratamento.
No seio das diversas escolas psicanalíticas, todas são unânimes em afirmar que a transferência é um dos pilares centrais da doutrina analítica. Entretanto, estas mesmas escolas, divergem no que diz respeito ao lugar da transferência dentro do setting analítico, seu manejo por parte do analista e o momento e os meios de sua dissociação.
A importância deste conceito é percebida quando Freud não apenas “teoriza” o termo, mais lhe atribui propriedades curativas no tratamento psicanalítico.
Em 1912, Freud escreveu em A dinâmica a transferência seu parecer sobre o tema em estudo, identificando dois tipos principais de transferência: Positiva, expressa através de sentimentos de ternura e amor, e Negativa, vetor de sentimentos hostis e agressivos (ROUDINESCO; PLON. 1998, pág. 767).
A importância da transferência dentro da doutrina psicanalítica só é melhor discernida quando acompanhada pelos conceitos de resistência e interpretação, cujas atuações clinicas são capazes de dar sentido e importância ao tratamento psicanalítico.
Sandor Ferenczi, em 1909, observou que o fenômeno transferencial não é “exclusividade” da teoria freudiana. Ele notou, através de observação, que na maioria das relações humanas a transferência estava presente, como, por exemplo, na relação professor-aluno, marido-mulher, chefe – subordinado, etc. Se for buscado nos documentos científicos/culturais anteriores aos escritos freudianos, percebe-se que já se faziam menção ao fenômeno citado, sendo visto, no senso comum, como uma “projeção de lembranças passadas em um momento presente”.
O grande diferencial psicanalítico reside que, quando devidamente manejada, a transferência permite uma maior aproximação do self do analisando, gerando um painel de diversas vivências, possibilitando ao analista ajudar o ego do paciente a se reestruturar e reequilibrar a homeostase psíquica.
Sem o devido manejo técnico, toda e qualquer transferência é efêmera, podendo surgir em diversas relações de contatos sociais e, em alguns casos, podendo até prejudicar certos laços afetivos. No contexto psicanalítico, tal situação deve ocorrer diante dos olhos atentos do profissional que irá, de forma sensata e ética, manejar o tripé psicanalítico (resistência – transferência – interpretação) de forma que o mesmo redunde em cura para o paciente.
Por este motivo, a transferência é o ponto vital para o sucesso do tratamento psicanalítico.
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